O SUS em um cenário de mudanças e questionamentos
O SUS em um cenário de mudanças e questionamentos
São Paulo, outubro de 2019 – No segundo dia do Global Forum Fronteiras da Saúde a plateia teve uma aula com Gonzalo Vecina, criador e primeiro diretor da ANVISA e professor da Faculdade de Saúde Pública da USP, em São Paulo, sobre a história dos sistemas de saúde que existiram no Brasil, a criação do SUS, o momento atual e o que desejar para o futuro.
A primeira provocação feita por Vecina foi responder à pergunta “era muito melhor antes?” A tendência é achar que sim, mas como, se antes não sabíamos de tantas coisas e conhecimento é poder? Isso porque, de acordo com o médico, “temos medo do amanhã e nos falta coragem e atitude para construir nosso futuro”. O SUS é um sonho corajoso de pensadores da saúde que encontrou guarida na Constituição.
O que o Brasil tinha desde 1923 era um modelo baseado na saúde alemã, de que quem tem carteira assinada tem direito à saúde, que fazia parte da seguridade social. A Constituição de 1988 fez a pergunta “o que o brasileiro quer do Brasil?” e a resposta foi “um Brasil civilizado”. Transpondo isso para a saúde nasceu o modelo de acesso universal, integral e igual.
O grande problema é manter a saúde sob esse trinômio, sendo que no Brasil as desigualdades sociais são um desafio enorme, onde, por exemplo, as mães negras têm três vezes mais chances de morrer no parto, por questões menos genéticas do que, pela pobreza e falta de acesso.
Segundo Vecina, o primeiro grande problema do SUS é a falta de dinheiro e não há como resolvê-lo em meio a crise que vivemos. Países desenvolvidos na Europa não têm piso porque coloca-se na saúde o que a população vê como necessário. ”Aqui não somos civilizados, por isso temos que ter piso”, ressalta. E o fato de não haver financiamento de políticas públicas, que são o meio pelo qual a saúde deve ser implantada.
O segundo grande problema é a gestão, pois temos imensa irresponsabilidade com eficiência. “Concursar e licitar é um desastre!”. O mundo mudou com a tecnologia da informação e continuar gerindo o SUS como hoje atravanca processos e fluxos. “Se a saída da gestão é através da iniciativa privada, que se crie regularização para isso”, reflete Vecina. O terceiro ponto é rever o caminho assistencial. A Estratégia Saúde da Família dá resultados fantásticos, mas ainda há que se resolver o acesso à regulação. O sistema de saúde oferece cuidado e cura, e a atenção básica resolve a questão do cuidado, mas o curar precisa ser trilhado no acesso à assistência secundária e terciária.
Sem falar em problemas como a falta de médicos e de integração com uma indústria nacional de equipamentos, medicamentos e vacinas.
“O amanhã depende de nós. O que o legislativo e o executivo vão fazer é o que nós permitiremos que façam. O SUS é uma construção e será melhor tanto quanto a sociedade for melhor” garantiu o médico.